quinta-feira, 19 de julho de 2012

Proibição de vendas de linhas para celular evidencia falta de regulação

Empresas de telefonia tentam culpar burocracia por após decisão da Anatel; Ativistas e entidades de defesa do consumidor pedem que agência cumpra papel regulador
Rede Brasil Atual
Campeãs nacionais de reclamações, as operadoras de telefonia móvel dizem haver sido surpreendidas com a decisão da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) de suspender por 30 dias a venda de novas linhas de telefonia celular. A surpresa deu-se pelo fato de que a medida cautelar é a ação mais expressiva do governo federal na tentativa de impor uma melhoria dos serviços telefônicos prestados por empresas privadas. Para ativistas e entidades de defesa do consumidor a medida é válida, porém, resolve apenas uma parte do problema, não levando em conta a regulação e a fiscalização constantes.


Para João Brant, do Coletivo Intervozes, ao impor a suspensão das vendas de novos chips, ficou claro que a necessidade premente é um acompanhamento severo dos trabalhos das teles. No mesmo dia em que anunciou a suspensão, a Anatel informou que há 256 milhões de linhas de telefonia móvel ativas no país – uma estatística que, adverte o militante, foi utilizada muitas vezes pelo governo como um sinal positivo. "Esses 250 milhões de chips vendidos são um reflexo do nosso problema, não da nossa solução. Você acaba tendo uma saturação das redes. As empresas, por conta de competição e para atender à demanda, põem à venda milhões de novos números sem ter tecnologia suficiente para isso", critica o ativista.


A partir de segunda-feira (23) estará suspensa a comercialização de linhas de telefonia celular e internet em 19 estados para a operadora TIM, cinco estados para a Oi e três para a Claro. A liberação da venda está condicionada à apresentação de um plano de investimentos em até 30 dias, tratando principalmente da qualidade da rede, do completamento de chamada e da diminuição nas falhas de serviços.
Entre 1º de janeiro e 30 de junho de 2012, foram registradas pelo sistema 861.218 demandas. Dessas, 78.604 (9,13%) foram relativas às operadoras. O número supera o volume de reclamações contra operadoras de cartão de crédito, bancos e telefonia fixa, também motivos de dores de cabeça. 
A medida cautelar de proibir novas vendas antes de um plano mais rígido de investimento por parte das operadoras, por si só, já representa uma mudança na cultura de fiscalização e autuação da Anatel, segundo a advogada do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) Veridiana Alimonti.
Ela afirma que a aplicação de multas – muitas vezes ineficiente – sempre foi a medida mais comum adotada pela agência.  "Nós, das entidade de defesa do consumidor, sempre dissemos que a Anatel deveria melhorar e se valer mais de medidas cautelares. A agência sim estabelece a necessidade de planejamento por parte das empresas. E isso reflete nas medidas que vai fazer nos próximos anos", considera a advogada.

Brant, do Intervozes, dá exemplos da lacuna aberta em razão da falta de regulação no setor de telefonia: "O Brasil tem 250 milhões de números e isso significa, na prática, que as pessoas estão comprando chips de várias operadoras porque há preços muito mais baixos para ligações de uma mesma operadora. O modelo atual não barateia custos e faz com que elas possam cobrar preços exorbitantes de interconexão, que é a ligação entre difentes empresas".

Para Maria Inês Dolci, coordenadora institucional da Proteste, a Anatel não cumpre com seu papel básico de regular o setor, de modo a equilibrar a relação entre consumidores e empresas prestadoras de serviço. Ela considera que isso faz com que ofereçam serviços que já estão saturados e não consigam dar solução aos problemas ocasionados. "Isso mostra que existe um vácuo regulatório muito grande, uma agência reguladora tem de atuar de forma mais severa. É também uma questão de expansão desordenada dos serviços, com aumento das mesmas reclamações. Como posso expandir dessa forma? Tem que segurar o problema aí", defende.

Somente no primeiro semestre deste ano, o Procon de São Paulo recebeu 12.215 queixas sobre telefonia móvel, contra 9.402 no mesmo período do ano passado, um aumento de 29%. Segundo o órgão de defesa ao consumidor, entre 1º de janeiro e 14 de junho, as empresas que mais provocaram demandas no setor foram Claro (1.984 reclamações), Tim (1.385), Oi (996), Vivo (842) e Nextel (506). O órgão reconhece a severidade da decisão da Anatel, mas afirma que foi uma medida necessária.

A defesa

O Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal (SindiTelebrasil), que representa as empresas do setor, afirmou, em nota, que a principal barreira para melhoria do sistema está na dificuldade burocrática de expansão de novas antenas e diz estar "surpreso" com a medida da Anatel. Afirmou, ainda, que “não é de hoje que o setor de telecomunicações cobra das autoridades brasileiras ações que viabilizem a implantação de infraestrutura”, diz a nota.
Hoje (19), o presidente da Claro, Carlos Denteno, uma das empresas atingidas com a suspensão, reuniu-se com o superintendente de Serviços Privados da Anatel, Bruno Ramos. Eles divergiram sobre a proporção da deficiência na prestação de serviços da companhia. Para a operadora de telefonia, o problema é basicamente no atendimento docall center, ao passo que para a agência reguladora há problemas não só no atendimento, mas no funcionamento da rede.
Todas as operadoras de serviço de telefonia celular no país, inclusive as que não sofreram suspensão nas vendas, deverão apresentar plano de investimento e melhoria da qualidade dos serviços de rede e do atendimento dos call centers para os próximos dois anos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário