quarta-feira, 28 de agosto de 2013

O Poderoso Lobby dos Planos de Saúde



Com faturamento recorde, ascensão do mercado, influência política, exploração dos médicos e subsídios públicos, o negócio dos planos de saúde exibe crescimento vertiginoso.    

Cremesp

Calcula-se que cerca de 160 mil dos 371.788 médicos em atividade no país atuam na assistência suplementar. O Estado de São Paulo tem 106.536 médicos registrados, cerca de 58 mil deles atuando em planos e seguros de saúde. Dos 46.601.062 habitantes do estado (IBGE, 2010), 18.458.387 são atendidos nas diferentes modalidades de planos de saúde. Significam 44,7%, contra 24,5% da média nacional. Na capital São Paulo, a população coberta pela saúde suplementar já superou a do SUS. Dos 10,7 milhões de habitantes, 63,2% são usuários de planos ou seguros de saúde. Os números indicam que o Estado de São Paulo representa um negócio bilionário para a saúde suplementar, com 560 empresas. No Brasil, o crescimento desse mercado vem ocorrendo em todos os estados, com cerca de 4 milhões de novos usuários por ano. Ao todo, são 1.037 operadoras atuando, entre empresas de medicina de grupo, cooperativas médicas, autogestões, seguradoras, filantrópicas e administradoras. No conjunto do País, a receita do setor subiu 159,7% de 2003 a 2010. O crescimento anual tem passado dos 10%. Em 2009, o faturamento atingiu R$ 65,8 bilhões, passando para R$ 74,6 bilhões em 2010, crescimento de 13,37%.

O lucro líquido de muitas operadoras chega a 20% ao ano, muito superior ao do setor financeiro, conforme dados revelados pelas próprias empresas em audiência pública na Câmara dos Deputados em 2010.

Os índices de inflação acumulados em 12 anos chegaram a 120%, os reajustes dos planos somaram 150%, enquanto os honorários médicos não atingiram reajustes de 50% no período. Ou seja, o preço dos planos subiu três vezes mais que o valor da consulta paga aos médicos.

Até final de 2010 a maioria dos planos de saúde pagava entre R$ 25 e R$ 40 por consulta médica. Com as paralisações e manifestações intensificadas a partir de abril de 2011, essa média passou, em alguns locais, para R$ 50 a R$ 60,00, com reajustes escalonados em até dois anos. Mesmo assim, ainda distantes do mínimo reivindicado pelas entidades médicas, de R$ 80,00.

Em janeiro de 2011, matéria de capa da revista Exame sobre o bilionário dono do maior plano de saúde do país, causou revolta quando o entrevistado deu uma demonstração de como o setor desconsidera os médicos, ao declarar: “Se você quer ser sardinha, ande com sardinhas; se quer ser tubarão, ande com tubarões”.

Demonstração do poder de influência dos planos de saúde está no apoio financeiro das empresas deste setor a candidatos nas eleições. Em 2010, conforme estudo da USP e UFRJ, os planos destinaram mais de R$ 12 milhões a campanhas eleitorais que ajudaram a eleger 38 deputados federais, 26 deputados estaduais, cin- co senadores, além de cinco governadores e a pre- sidente da República. Outros 82 candidatos, não eleitos, também receberam apoio financeiro.

Além do apoio a políticos, os planos de saúde indicam seus representantes para ocupar cargos estratégicos , diretorias e até a presidência da ANS.

Vale ressaltar, ainda, que os planos de saúde recebem subsídios públicos, direta e indiretamente, pois são beneficiados com a renúncia fiscal, dedução no imposto de renda de pessoas físicas e jurídicas, com a isenção de tributos que favorecem determinadas cooperativas médicas e planos de hospitais filantrópicos, com a venda de planos privados para o funcionalismo público e com o atendimento de seus usuários em serviços do SUS sem o devido ressarcimento aos cofres públicos.



O alto custo do lobby (Matéria da Carta Capital em Asmetro.org  )

Nomeado no início do mês, o novo diretor da Agência Nacional de Saúde Suplementar, Ela no Figueiredo, é alvo de um processo na Comissão de Ética da Presidência da República. A investiga­ção foi instaurada apedido da Casa Civil, após a revelação de que Figueiredo atuou por mais de dez anos como representante jurídico das operadoras de planos de saúde Hapvida e Unimed. Em ao menos 21 pro­cessos, o advogado moveu ações contra a própria ANS, na tentativa de reverter pu­nições aplicadas às empresas por se ne­gar a pagar o tratamento de segurados. Esse fato foi omitido no currículo enviado ao governo federal e ao Congresso, on­de o dirigente passou por uma sabatina. Entidades médicas e associações de defesa do consumidor exigem o seu afas­tamento, por causa do flagrante confli­to de interesses. Servidores da ANS tam­bém enviaram uma carta ao ministro da Saúde, Alexandre Padilha, em que exigem a troca do diretor.

"Não é a primeira vez que uma raposa é escolhida para cuidar do galinheiro. "Há uma porta giratória na ANS. Executivos de operadoras de planos de saúde assu­mem postos-chave na agência regulado­ra e, depois, voltam a atuar no mercado de saúde suplementar, o que levanta dúvidas sobre a isenção da entidade", comenta o pesquisador Mário Scheffer, professor da Faculdade de Medicinada USP. Ex-diretor de um hospital da Amil, Alfredo Cardoso foi diretor de Normas da A NS entre maio cie 2004 e outubro de 2010. Oito meses depois de deixar o cargo, assumiu a superintendência da Amil Dental. Em quarentena após deixar a presidência da ANS, Mauricio Ceschin foi presidente da Medial e da Qualicorp, a maior corretora de pla­nos de saúde do País.

Em resposta a CartaCapital, Figueiredo nega ter omitido informa­ções ao Senado Federal ou em quais­quer órgãos públicos. Não existe nenhu­ma restrição legal que impeça a nome­ação de diretores da ANS que tenham atuado anteriormente no setor de saú­de suplementar, registra ainda a assessoria de imprensa da agência reguladora. "Portanto, considerando a determina­ção legal, não há conflito de interesses."

Atualmente, 47,9 milhões de brasileiros, cerca de um quarto da população, possuem planos de saúde. Trata-se de um mercado que faturou mais de 95 bilhões de reais em 2012,e que lidera os rankin­gs de reclamações dos órgãos de defesa do consumidor. As principais queixas dizem respeito à negativa de exames e consultas, mas também aos reajustes abusivos. Em 2012, a ANS recebeu mais de 75 mil recla­mações de usuários. A fiscalização resul­tou na aplicação de cerca de 2,5 mil mul­tas às operadoras. Desde 2011. 396 planos de 56 empresas tiveram a comercialização suspensa para proteger os consumidores.

Em julho, a ANS autorizou as operadoras de planos de saú­de individuais ou familia­res a reajustar os preços em até 9,04%, o maior aumento dos últimos oito anos e acima da infla­ção acumulada no período, de 6,49%, se­gundo o IPCA. A medida tem impacto para perto de 8,4 milhões de segurados. Os demais, quase 40 milhões de brasilei­ros, são usuários de planos coletivos ou empresariais, que podem reajustar seus preços sem ter um limite imposto pela agência reguladora. "O grande problema é que parcela significativa dos planos co­letivos contempla menos de 30 vidas. E eles têm pouco poder de barganha para conter aumentos abusivos", afirma Joana Cruz, advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC).

Para verificar os reajustes dos planos coletivos, desconhecidos por não serem regulados pela ANS, o IDEC realizou uma pesquisa com base em 118 ações judiciais e constatou que os aumentos podem chegar a até 538,27%, com uma média de 82,21%. A Justiça considerou os aumentos abusivos em oito a cada dez casos. "Mas não são apenas os preços que ameaçam os segurados. Há mais de 400 procedi­mentos reconhecidos pela Associação Médica Brasileira que a ANS não exige que as operadoras ofereçam para os seus usuários", diz Cruz.

Revisto de tempos em tem­pos, o rol de procedimentos obrigatórios tem incorpo­rado novos exames e trata­mentos, como a quimioterapia domiciliar, exigência imposta aos planos em 2012. Mas procedimentos de alto custo, entre eles transplantes de co­ração. pulmão e fígado, continuam fora da lista, e são custeados exclusivamente pe­lo Sistema Único de Saúde.

Para o IDEC, trata-se de uma grave omissão da ANS, pois a Lei n° 9.656, de 1998, define claramente que os planos de saúde são obrigados a oferecer assistência mé­dica para todas as "doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial da Saúde". As exclusões estão previstas em lei, como tratamentos experimentais e inseminação artificial. "E os transplan­tes nem sequer de longe se enquadram nessas categorias."

Os planos de saúde também são malvis­tos pelos médicos, apesar de oferecerem remuneração melhor que a do SUS. Nove em cada dez profissionais afirmam sofrer interferência das operadoras em sua au­tonomia, segundo pesquisa divulgada pe­lo Datafolha em 2010. A ingerência costu­ma ocorrer com a recusa total ou parcial de medidas terapêuticas (segundo 78% dos 2.184 entrevistados em 26 estados e no Distrito Federal) e com a limitação do número de exames (75%). "Se um médico pede procedimentos desnecessários, ele pode ser denunciado nos conselhos re­gionais de medicina. Em vez de optar pe­la denúncia, o que exigiria apresentar pro­vas da inépcia do profissional, as operado­ras preferem a retaliação, normalmen­te com o descredenciamento do médico", comenta Aloísio Tibiriçá, vice-presiden­te do Conselho Federal de Medicina. "E o valor pago pelas consultas médicas conti­nua muito baixo, em média 46 reais." De toda forma, o valor é quase quatro vezes superior ao pago pelo SUS.



 ELANO FIGUEIREDO, O NOVO DIRETOR DA ANS, ATUOU POR MAIS DE DEZ ANOS COMO REPRESENTANTE JURÍDICO DE OPERADORAS.

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